Em 2014, o status quo do skate era bem diferente do que é hoje. Tudo bem, são só 10 anos de diferença, mas as mudanças que as redes sociais trouxeram de lá pra cá foram cruciais para a guinada de direção que o “viver de skate” daria.
O instagram não era o que é hoje e o tiktok nem existia. Então ter footages de skate era diferente, tinha que realmente ir filmar com alguém e depois colocar em um vídeo. Até estava começando a ter vídeos no insta, mas era outra coisa. Talvez esse tenha sido um dos últimos anos que o skate foi assim.
E nessa de ir filmar, criar um próprio estilo, se destacar no vídeo, a Supreme, loja icônica de Nova Iorque, sabia bem o que tinha que ser feito. Seu primeiro vídeo, o A Love Supreme, de 1995, já tinha seu DNA bem definido, trazendo skatistas de peso da cena da cidade, o jazz marcante e o estilo de filmagem que se tornaria marco da costa leste dos Estados Unidos. Filmado por Thomas Campbell, Jason Diamond e James Jebbia, esse promo da Supreme tinha desde Mark Gonzalez e Peter Bici até Keith Hufnagel e Aron Suski.
O vídeo tinha como título a música de mesmo nome de John Coltrane. Era jazz puro.
Nos anos seguintes a Supreme continuaria seu legado de skate, moda e presença em Nova Iorque, realizando ações e apoiando pessoas da cena, mas sem nenhum vídeo grande o suficiente para recolocar a marca como o centro das atenções audiovisuais do skate. Até chegar em 2014 e Bill Strobeck reunir uma gangue pesada para lançar o “cherry”.
Bill Strobeck e seu estilo de filmagem
William Strobeck, o Bill, ou Fat Bill, nasceu em 1978 e começou a filmar skate nos anos 90 com seus amigos em Syracuse, Nova Iorque. O primeiro trampo grandão que tinha o Strobeck de skate foi o Mosaic, da Habitat, em 2003. Depois, dirigiu um do Mark Gonzales pela Krooked, chamado “Mcbeth – Mark Gonzales”.
Depois disso fez mais alguns trabalhos no mundo do skate, da arte e da música, até chegar em 2012 na Supreme e começar a filmar para o que viraria o cherry, o primeiro vídeo da marca full lenght em quase 20 anos de companhia.

A marca que o Strobeck deixou não foi só de dirigir o vídeo. Ele tinha uma linguagem no cherry que muita gente veio copiar depois e que meio que deu o tom do que seria a linguagem audiovisual do skate dali pra frente para quem não estava usando as analógicas VX1000. Strobeck vinha de HD, apostava nas cores fortes, trazia um slow motion acentuado e, sua maior marca, o zoom in e zoom out antes e depois das manobras.
Filmar a cara, depois filmar a manobra, depois filmar a cara.
Tudo bem, ele pode não ter sido o primeiro que fez isso, nem ser o estilo que todo mundo gosta. Mas é inegável que esse estilo de filmagem e de interesse que ele botava nas imagens foi algo que influenciou muita gente que viu o cherry e tentou fazer igual depois.
Gonz, Paulo Diaz, Huf e outros
Um vídeo da Supreme sempre vai ter lendas do skate, principalmente daqueles que vivem em Nova Iorque. Então ter Mark Gonzales (que apareceu no A Love Supreme em 1995) junto do Keith Hufnagel e de outros caras era muito importante. É a admiração pela história e construção de legado que a Supreme estava fazendo, entendendo de onde vinha e para onde ia.
Nesse respeito às origens, eles colocaram uma parte toda só do Paulo Diaz, uma lenda do skate dos anos 90, marretando e tocando sua própria trilha de parte numa flauta.
E não parou por aí, porque tinha Eric Koston, Guy Mariano, AVE, Anthony Pappalardo e mais uma porrada de ícones do skate que flutuaram no radar da Supreme desde que a loja é loja e foram importante para criar a identidade que ela estava tomando ali.
A parte do Dylan x Alex Olson
Dylan Rieder e Alex Olson. Em 2014. Com INXS de trilha sonora. Não tinha como dar errado e não deu. A parte que os dois HANDSOME TEAM dividiram foi icônica, trazendo tricks e situações interessantes (e algumas polêmicas, como um senhor fumando crack com o Anthony Pappalardo no final).
O Alex Olson tem uma carreira maneira no skate, mas é inegável o impacto do Dylan Rieder nessa parada toda. Beleza, ele era lindo, usava a calça de um jeito que influenciou geral, fazia propaganda pra marca high fashion, mas nada disso escondeu o fato que o bicho andava MUITO de skate. Essa parte do cherry diz isso e todas as suas outras também.
O fato dele ter falecido anos depois também foi algo que fez o cherry ser ainda mais especial.

Isso foi icônico, tá?
A molecada de Nova Iorque
Uma coisa que o Strobeck sempre fez com a Supreme foi dar espaço para uma molecada nova no skate. Nos vídeos que ele fez com a loja, isso sempre foi um fator central. No cherry não foi diferente, aliás, foi o impulsionador dessa ideia.
A molecada, e por molecada é tipo adolescente e criança, mesmo, sempre foi destaque, tendo partes e manobras em momentos cruciais dos vídeos. No cherry, eles abrem e fecham, mesclando cenas com Mark Gonzales e com outros lendas.
Na-kel Smith, Sean Pablo, Sage Elsesser, Kevin Bradley, Tyshawn Jones, Ben Kadow… A lista é longa e muitos aí tiveram seus primeiros minutos de grande destaque no cherry. Tysahwn, que fecha o vídeo, depois viria a se tornar SOTY duas vezes e os outros sempre foram skatistas de destaque na cena internacional. A “categoria de base” do Strobeck sempre foi bem assertiva.
Outro fato curioso é a cena que realmente termina o vídeo em que a lenda Harry Jumonji, sim esse mesmo brasileiro, fala que se você não prestar atenção na juventude, depois eles vão te comer vivo! Bem dahora.

O que veio depois
Se foi pelo cherry ou pela construção de marca que eles estavam fazendo internacionalmente, fato é que a Supreme deu um boom nos anos seguintes do vídeo. De aparecer em celebridades (isso já acontecia, mas passou a acontecer mais) a inaugurar lojas por vários outros países, a marca foi até vendida para uma big corp e começou a hypar muito.
Aqui no Brasil era difícil ver gente usando a marca, era mais quem flagrava mesmo. Mas depois de 2014 começaram a ter várias falsificações e hoje em dia não é difícil você achar toucas, camisetas e bonés com o logo icônico da Supreme vermelho.
A influência do cherry foi para além dos zoom do Strobeck e das músicas icônicas nas partes, mas também no jeito de se vestir de uma galera e onde comprar suas camisetas brancas. Depois de 2014, todo mundo em algum momento quis uma camiseta brancona com o logo vermelho da Supreme no peito.
Dez anos de “cherry” da Supreme. Assista abaixo:

